Chico Berg: compositor, vocalista e poeta.
foto: Guto.
RAMALHETE
(Chico Berg)
Teus olhos quiseram ser
O poema verde
Em que me embato
E mato a minha sede.
Que a tristeza embargo
Nessa vida acesa
Nesse riso largo
Que se põe na mesa.
Vem, vem, vem enquanto é cedo
Rompe a madrugada
Sem medo.
Que o dia vai brilhar
Vai ruir o rochedo
Que o dia vai brilhar
Vai ruir o rochedo.
Tem-me na chama teso
No caminho largo
Sonho que me alargo
E que me deixa preso
Teus olhos quiseram ser
O poema verde
Em que me embato
E mato a minha sede.
Se na tristeza esbarro
Só teus polhos verdes
Enfeitam-me o jarro
No gosto de ter sede.
Vem, vem, vem enquanto é cedo
Rompe a madrugada
Sem medo.
Que o dia vai brilhar
Vai ruir o rochedo
Que o dia vai brilhar
Vai ruir o rochedo.
Pablo: violão e vocais.
foto: Verônica.
DESESPERO
(Chico Berg)
Aqui jaz um poeta
Se masturbando em plena via pública
Num desafio a todo tipo de censura.
Em vez da luz que há tanto procura
Embrenhou-se na secura e azedumes
Que a vida é uma faca de dois gumes
Entrecortada de perjura
Entrelaçada nesse fio que se diz costumes.
Aos olhos de espanto
De arquejos e soslaios
Ejacula o sacrilégio
Por entre desdém e desmaios
Na lisura de um riso paraplégico.
E num adunar de gozo e de loucura
O acalanto subjaz
Perdido, perfura
O canto
Não de paz, mas de agrura
Em que não se reata a vida sem erro nem rasura.
Aqui jaz um poeta
Que refaz de pasmo em orgasmo
A mais completa conjuntura.

Gigante: percussão.
foto: Guto.
LUA DE LUANDA (ou Ciranda de Luanda)
(Chico Berg)
Anda ligeiro, cirandeiro, ô
No meio da rua a cirandar.
Ando matreiro, tou cabreiro, ô
Na gangorra a rodar.
Nem o tempo desanda...
Lua, Luanda, anda!

Na ciranda do povo a cantar!

Comeram a banda da lua
E você nem notou
E a ciranda na rua
Eu nem sei quem levou
E essa gangorra insiste que morra, nos cativou
Se o olhar nem abranda
Quando anda ou desanda
Na lua de Luanda, Luanda.

Anda ligeiro, cirandeiro, ô.
Senão a gangorra vai pegar.

E essa ciranda no meio da rua,
rodando a pua
rolando a lua
a cirandar
A cirandar!

É a ciranda do povo a cantar!

Engenho que mói
Não molda o herói
Empenha a vida e manda
Que desaprender dói
Deaprender dói.

E a ciranda do povo a cantar!

Se a luta é nossa, se apossa, se empossa
Sai dessa fossa
Sai dessa gangorra
Antes que morra
Antes que morra.

Olha a ciranda cirandeiro, ô.
E o mundo inteiro a girar.
(Link da música nos comentários.)
TORTO
(Pablo e Chico Berg)
Crescem mansões
Com as dores da favela
A lei rega o silêncio
Isola e vela
A revolta.

Nos cárceres em cada rosto
O olhar de desgosto nasce seco
E o sorriso vive torto.
E o sorriso vive torto.

O medo é flor de cada beco
O medo é flor e o canto é dia
Que já nasce morto.
Breno Honorato Nascimento.

Baixo e percussão.

foto: Guto.

CAIANA DO POVO
(Chico Berg)

Vem vadiar, morena
Morena, vem vadiar
Tou procurando ciranda
E a cirandeira do lugar.

Caiu a noite
Caiu a estrela
O olhar dentro do mar
Só o perfume da morena
Ficou a lembrar o seu olhar.

Vem vadiar, morena
Morena, vem vadiar
Tou procurando ciranda
E a cirandeira do lugar.

Meu Deus, meu Deus, meu Deus
O que é que vou fazer?
No mar de tanta gente
Eu encontrar você?
Vem vadiar, morena
Morena, vem vadiar
Tou procurando ciranda
E a cirandeira do lugar.

Cada estrela que caiu
Noutro dia vai luzir
Só a caiana do povo
Ciranda de novo
A insistir.

Vem vadiar, morena
Morena, vem vadiar
Tou procurando ciranda
E a cirandeira do lugar.
VULCÃO
(Chico Berg)

A morte canto pela vida.
A vida canto pela morte.
Canção
Que só a sorte cava.

Não me fadiga, me instiga
Me intriga a vida
Que do amor escava.

E entre dois extremos um compromisso
Sigo insubmisso à omissão das larvas.

O que atormenta o meu vulcão
Não são apenas suas lavas
São os sonhos só de palavras
São os sonhos só de palavras.
Ô, ô, ô, ô.
TREME TERRA
(Chico Berg - Pablo)

Eu quero ver no dia que o sol nascer.

O treme terra faz a Terra se envolver
E quando berra faz medo se dissolver

Eu quero ver no dia que o sol nascer.


Se correr o bicho pega
Se ficar o bicho come
E junte os homem
Bote o bicho pra correr.

Eu quero ver no dia que o sol nascer.

Nem queira calma
Nem fique calado
Mundo sem alma
Só se ouve o outro lado.

Esperneia!
Na areia clareia
A luz incendeia
Ateia fogo, fogo, fogo na aldeia.
Ateia fogo, fogo, fogo na aldeia.
BEIRA MAR
(Chico Berg - Pablo)
Beira mar (ô beira mar)
Beira mar (ô beira mar)
Vem
Que vou devagar.

A esse encontro passo pontes
Faço rios, pulo montes
Faço da fonte horizonte
Pra se chegar.

Beira mar (ô beira mar)
Beira mar (ô beira mar)
Vem
Que vou devagar.

Derrama esses ares
Onde possa flutuar
Voluteando ao sol
Onde possa se deitar

Nesses verdes desses mares
Quero navegar.

A melhor ciranda é
Na beira do mar.
Na beira do mar.
Na beira do mar.

CARIRI
(Chico Berg - Pablo)
Meu cariri,
Ó meu cariri.
Sofre tanto a opressão da seca
Sofre também
Com as mãos de tanta cerca.

Tanta terra, pouco dono
Tanta gente morrendo de fome
E as famílias de renome
Fingem ajudar
Injetando sono.

Meu cariri,
Ó meu cariri.
Sofre tanto a opressão da seca
Sofre também
Com as mãos de tanta cerca.

Vai se acabar essa demência
Com crença ou razão
Quando o povo der ciência
Da força de suas mãos.

Iberê: viola







Foto: Veronica.


Michel: voz e violão.